Durante o último ano minha mente foi invadida por diversas matérias em diversos meios de comunicação sobre a febre do momento: Personal Friend. Isso mesmo, um amigo alugado. Cai por terra a velha história de que com dinheiro não se compra tudo. Hoje você pode até comprar um amigo.
Nesse mundo globalizado onde tudo e todos estão mais perto do que nunca, fica difícil entender essa ligação tão impessoal surgindo no momento. Seria porque as pessoas andam tão afastadas do mundo real e ligadas ao mundo virtual que aflora essa necessidade de alugar um amigo?
Nessa onda ainda tem os velhos malandros que se com um olhar mais oportunista viram na nova moda uma forma "fácil" de ganhar dinheiro. Quando abrimos um jornal ou acessamos um site com anúncios de jornais estampando alugueis de amigos a primeira vista nos leva a suspeitar da situação, chegando até ser cômico. Conversei com pessoas sobre o assunto que riram achando que se tratava de uma piada de mal gosto. Mas de piada nada tem.
Larissa Coldibeli, colunista paulista do site Guia da Semana, citou em uma matéria similar que o personal friend é o amigo que não julga suas atitudes e que sabe guardar segredo. Basta você ter uma polpuda conta bancária. Seguindo esse pensamento resolvi verificar o que andava ocorrendo nesse nosso novo mundo de amizades.
O conceito foi criado pelo psicólogo carioca Silvério Veloso, onde em entrevista ao jornal Extra, comentou que a idéia original não era vender um ombro amigo e, sim, ajudar as pessoas que assistiam às suas palestras a aplicar de forma pratica os conceitos empreendedores no dia-a-dia. O negócio deu tão certo que hoje ele abriu mão de ficar a frente da empresa familiar no interior do RJ para se dedicar exclusivamente ao serviço de amigo de aluguel.
No meio de minhas pesquisas encontrei vários anúncios em jornais e websites espalhados pela rede de pessoas que estão mergulhando de cabeça nesse novo negócio. Escolhei alguns deles e decidi ligar para ter uma idéia do que realmente eu estava lidando. No primeiro momento não me identifiquei como repórter, agi normalmente como se fosse uma futura cliente.
Na minha primeira tentativa em falar com Antônio, que expôs seu anuncio um site de classificados na rede, só consegui deixar recado na caixa postal que foi rapidamente respondido. Assim que atendi ao telefone senti em sua voz uma certa desconfiança, mas continuei o desenrolar da conversa sem me ater a detalhes pessoais, somente ao que ele ia dizendo sobre o que é ser um personal friend. Do outro lado, ele calmamente me explicava que era novo no "negócio" e que tudo começou após ter lido a matéria de Silvério no Extra Online, e como estava desempregado pensou porque não poderia unir o útil ao agradável. Confesso que me deu vontade de rir, desligar, chorar, qualquer coisa. Pensei em como pode ter alguém que queira se vender parar ser companhia de alguém, mas logo fui puxada no pensamento no fato que, se existe alguém para vender é porque existe um público para comprar.
Antônio comentou que o serviço é simples, o cliente liga marca um primeiro encontro em um local público, quase sempre em shopping, e lá ao se encontrarem existe um estabelecimento de normas a serem seguidos por ambos os lados. Os encontros com Antônio custam em média R$50, 00 por 1 hora de passeio. Os passeios variam de cinema, voltas no shopping, caminhadas na praia ou jantares em restaurantes. O pioneiro Silvério consegue angariar a bagatela de R$ 300,00 por 50 minutos.
Meu primeiro "encontro" com Antônio foi no Shopping da Gávea, na zona sul do RJ, ao chegar me apresentei e conversamos sobre "nós dois". Ele pergunta coisas básicas: nome, idade, estado civil, porque procurei esse serviço, o que espero encontrar desse serviço, essas coisas de primeiro encontro. Fiz as mesmas perguntas sobre ele e continuamos o papo. Já quase no final da conversa me identifiquei como repórter, no primeiro momento ele se assustou, mas logo de passado o susto disse que seria interessante conversar sobre isso.
Terminamos a conversa três dias depois, quando nos reencontramos em um restaurante no centro da cidade. Ele, sempre muito educado, contou que após ter lido a matéria do Silvério achou interessante o assunto e pensou porque não poderia fazer isso já que estava desempregado há mais de três anos e era considerado por seus amigos um bom ouvinte. Antônio tem 39 anos, é separado, tem dois filhos, mora sozinho na zona sul do Rio. É professor de educação física formado e estava à procura de um emprego quando surgiu a idéia de seguir os passos do psicólogo. Deu certo. Hoje ele tem uma carteira de clientes fiel em torno de 16 "amigos fixos", que sempre o chamam quando mais precisam, seja para ir simplesmente ao teatro ou até mesmo uma viagem de trabalho. Relatou que a maioria dos seus clientes são homens entre 25 e 40, com formação superior ou cursando, muito tímidos e/ou considerados diferentes e discriminados pela sociedade de alguma forma (nerds, homossexuais, excêntricos). Segundo ele são pessoas que quase sempre tem rotinas cansativas e monótonas, ainda completou dizendo que a maioria deles trabalha na área de informática e são muito inteligentes.
De acordo com a psicóloga Cristina Matos Soto, os personal friend podem até aliviar a solidão do momento, mas se os clientes tiverem algum problema psicológico como a depressão, por exemplo, esse pode piorar, pois fará com que os "amigos-clientes" se sintam diminuídos a ponto de ter a necessidade de pagar para ter uma companhia.
Claro que após um tempo de convivência com os determinados "amigos de aluguel", uma amizade verdadeira pode vir a surgir. O problema todo será se o antigo cliente, e atual amigo, decidir que quer acertar a conta. Agora basta saber se confiança também é um produto de consumo.
(Escrito por Ana Magal e publicado no jornal universitário Folha Universitária, da Universidade Castelo Branco - UCB - em 2007)
2 comentários
Poxa, também sou boa ouvinte. Eu quero! O desconcertante será se a pessoa for chata, tiver mal hálito ... só pra começar. rs Com homem, então, é sempre mais estranho. Confundem tuuuudo! Se você está só, está ao lado dele é porque está afim e ... não é beeeem assim. rs
Olá! Parabéns pela publicação. Eu também trabalho nesse segmento. Acho que o mundo de hoje pede isso. É uma situação que oscila entre o medo e a felicidade. Não que o dinheiro seja o 'motivo' maior, mas é o facilitador para que muitas situações possam vir a ter um final feliz.
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